terça-feira, 23 de agosto de 2016

transversal do Tempo

Dimensão que distende, que aumenta, que em largura se estende, me estende. O que acontece, que sucede, música que me embala, que me banha. Cabeça cheia de auroras, avanço empurrando portas sem batentes. Mais lassitude. Arco-íris de maravilhas. É tão bela a renovação; manhã pra todo lado. É possível? É verdadeiro? O mal, o angustiante, o mal interminável, uma cortina, uma cortina invisível o fez desaparecer. Felicidade! Eu não tenho mais que descer. Chegada, uma nova chegada. O rio das chegadas corre. Não há nada além de chegadas. Fluxo, fluxo sem fim repelindo obstáculos, delimitações, plenificante, plenificante, mausoléu que ainda corre. Sobre ondas expostas, ondas de mim, ondas de si, ondas viajando sobre ondas. Momentos, momentos sem rota, sem fora, sem volta, sem par, em formas, independentes. Um momento caule, um momento desarmado, um momento inteiro em pega&passa. Um momento precede, um momento se precipita, um momento chama, o eco de um momento. Um momento repassa, abandona, se alinha, um momento depois, um momento se afunda, um momento parente, um momento a rever. Um momento ainda. Um momento no lugar, um momento do começo do deslocamento de si, um momento remexido de cima a baixo, descobrindo um momento negro. Um momento de absoluto “não”, um momento mais hesitante, um momento favorável, favorecedor, acolhedor, um momento maravilhosamente destinado a mim, um momento de necessidade do galho de ouro. Um momento volver a proa, um momento estudante, um momento ainda ingênuo, um momento que apenas aprecia, um momento que leva para trás, um momento atocaiado há muito tempo. Um momento que vai mudar tudo. Um momento incomparável. Um momento passeio, um momento volta do passeio. Um momento chamando outros momentos. Um momento na corrente de água, um momento sobre a asa do vento, um momento caindo sobre uma imensidão de momentos. Um momento escorregando. Um momento perdido de vista. Um momento volta. Um momento já partido. Um momento que não avança mais. Um momento carregado de pressentimentos. Um momento que já deixa ouvir o caminhar do tempo. Um momento que foi sobretudo uma lacuna. Um momento em descalabro. Um momento que não tinha relação com nada resplandece no presente. Um momento ainda por vir. Um momento de uma outra vida. Um momento fremente, um momento que mais acalma o coração. Um momento sem rasura. Um momento realmente nenúfar. Um momento que atravessa a rua. Um momento que não insiste. Um momento sobretudo errante. Um momento dia seguinte de grandes momentos. Um momento que aquece, um momento que não quer se recolocar em mim, um momento que tem o peso de uma pétala de rosa que mais tarde pesará como chumbo. Um momento como certamente não acontecerá mais... Nômades sem mim. Momentos, momentos leves, nas lamas luminosas, animados, minúsculos afluentes. Oferendas para ninguém, vozes sem sílabas, sons sem instrumentos, companhias incessantemente que mudam, germinante música. Vindo, partindo, sem fronteiras, obstáculos fluidos a todo acabamento, destacando e se destacando sem ensinar o destacamento, Momentos, ruídos, travessias do Tempo.


[MICHAUX, "Moments"]