Dimensão que distende, que aumenta, que em largura se
estende, me estende. O que acontece, que sucede, música que me embala, que me
banha. Cabeça cheia de auroras, avanço empurrando portas sem batentes. Mais
lassitude. Arco-íris de maravilhas. É tão bela a renovação; manhã pra todo
lado. É possível? É verdadeiro? O mal, o angustiante, o mal interminável, uma
cortina, uma cortina invisível o fez desaparecer. Felicidade! Eu não tenho mais
que descer. Chegada, uma nova chegada. O rio das chegadas corre. Não há nada
além de chegadas. Fluxo, fluxo sem fim repelindo obstáculos, delimitações,
plenificante, plenificante, mausoléu que ainda corre. Sobre ondas expostas,
ondas de mim, ondas de si, ondas viajando sobre ondas. Momentos, momentos sem
rota, sem fora, sem volta, sem par, em formas, independentes. Um momento
caule, um momento desarmado, um momento inteiro em pega&passa. Um momento
precede, um momento se precipita, um momento chama, o eco de um momento. Um
momento repassa, abandona, se alinha, um momento depois, um momento se afunda,
um momento parente, um momento a rever. Um momento ainda. Um momento no lugar,
um momento do começo do deslocamento de si, um momento remexido de cima a
baixo, descobrindo um momento negro. Um momento de absoluto “não”, um momento
mais hesitante, um momento favorável, favorecedor, acolhedor, um momento
maravilhosamente destinado a mim, um momento de necessidade do galho de ouro.
Um momento volver a proa, um momento estudante, um momento ainda ingênuo, um
momento que apenas aprecia, um momento que leva para trás, um momento atocaiado
há muito tempo. Um momento que vai mudar tudo. Um momento incomparável. Um
momento passeio, um momento volta do passeio. Um momento chamando outros
momentos. Um momento na corrente de água, um momento sobre a asa do vento, um
momento caindo sobre uma imensidão de momentos. Um momento escorregando. Um
momento perdido de vista. Um momento volta. Um momento já partido. Um momento
que não avança mais. Um momento carregado de pressentimentos. Um momento que já
deixa ouvir o caminhar do tempo. Um momento que foi sobretudo uma lacuna. Um
momento em descalabro. Um momento que não tinha relação com nada resplandece no
presente. Um momento ainda por vir. Um momento de uma outra vida. Um momento
fremente, um momento que mais acalma o coração. Um momento sem rasura. Um
momento realmente nenúfar. Um momento que atravessa a rua. Um momento que não
insiste. Um momento sobretudo errante. Um momento dia seguinte de grandes
momentos. Um momento que aquece, um momento que não quer se recolocar em mim,
um momento que tem o peso de uma pétala de rosa que mais tarde pesará como
chumbo. Um momento como certamente não acontecerá mais... Nômades sem mim.
Momentos, momentos leves, nas lamas luminosas, animados, minúsculos afluentes.
Oferendas para ninguém, vozes sem sílabas, sons sem instrumentos, companhias
incessantemente que mudam, germinante música. Vindo, partindo, sem fronteiras,
obstáculos fluidos a todo acabamento, destacando e se destacando sem ensinar o
destacamento, Momentos, ruídos, travessias do Tempo.
[MICHAUX, "Moments"]